O Supremo analisa, no plenário virtual, uma ação apresentada em 2016 pelo Partido Social Liberal (PSL), que posteriormente se juntou ao DEM e se tornou o União Brasil. O partido questionou os seguintes pontos da legislação: o que determina que responde também pelo crime de integrar organização criminosa quem impede ou obstrui as investigações sobre o delito. Segundo o PSL, a conduta foi descrita em termos “vagos, abstratos, fluidos, abertos e desproporcionais”.o que estabelece que, quando há condenação definitiva contra funcionário público, este fica proibido de exercer funções e cargos públicos no prazo de 8 anos, que são contados depois do cumprimento da pena. De acordo com a sigla, a previsão não é razoável e fere a Constituição.o que prevê que o Ministério Público acompanhe casos em que há participação de policiais nos crimes de organização criminosa. Para o partido, há retirada de competências da Corregedoria das polícias para atuar nos casos. o que estabelece que quem colabora com a investigação renuncia ao direito ao silêncio e deve assumir o compromisso de dizer a verdade. No entendimento da legenda, isso fere o princípio da ampla defesa. ‘Não tem cabimento dizer que organizações criminosas combatem crime’, diz Cappelli sobre execução de suspeitos da morte de médicos O caso começou a ser analisado em junho de 2020, mas foi adiado com o pedido de vista (mais tempo de análise) do ministro Gilmar Mendes. Em junho deste ano, um pedido de vista do ministro Dias Toffoli voltou a interromper o julgamento. A deliberação foi retomada na última sexta-feira (10) com o voto do magistrado. O julgamento, no plenário virtual, termina às 23h59 desta segunda-feira (20), mas todos os ministros já votaram. No virtual, os ministros apresentam seus votos de forma eletrônica, sem a necessidade de sessão presencial. Voto do relator Em relação à punição por obstruir a investigação de organizações criminosas, o relator concluiu que a redação do trecho está de acordo com a Constituição. Para Moraes, o uso de termos mais abertos pelo legislador não foi por acaso, mas um mecanismo necessário para “amoldar condutas penalmente relevantes às alterações sociais cada vez mais rápidas”. “Não se pode argumentar, tampouco afirmar, que o tipo penal em análise seja ‘vago’, ‘abstrato’, ‘aberto’ ou mesmo ‘desproporcional’, sob o argumento de que agindo assim estaria a tipificar um sem-número de condutas. A escolha pelas duas condutas, no meu sentir, foi adequada para punir aquele agente que pretende obstruir investigações envolvendo organizações criminosas (não há na norma penal incriminadora qualquer violação ao princípio da legalidade)”, afirmou. O ministro também rebateu o argumento de que seria “desproporcional” a previsão de manter fora do serviço público por 8 anos o funcionário que foi condenado por envolvimento em organizações criminosas. “A previsão normativa mostra-se plenamente justificável, em razão da notável reprovabilidade da conduta daqueles (agentes públicos) que se envolvem com organizações criminosas”, ponderou. Quanto ao acompanhamento do inquérito policial pelo integrante do MP, o relator ressaltou que não há violação da competência da Corregedoria das polícias. “Não pode ser afastado o poder investigatório criminal dos promotores e procuradores, para que, nos casos que entenderem necessário, produzam as provas necessárias para combater, principalmente, a criminalidade organizada e a corrupção, não parecendo razoável o engessamento do órgão titular da ação penal”, salientou. Moraes também votou para fixar uma orientação da aplicação do trecho da lei que trata do direito ao silêncio de colaboradores, também chamado de delatores. Para o ministro, embora a lei use o termo “renúncia” para tratar do direito ao silêncio, o colaborador não abdica de seu direito de não produzir provas contra si, já que é um direito fundamental e não pode ser rejeitado. “Os benefícios legais oriundos da colaboração premiada servem como estímulo para o acusado fazer uso do exercício de não mais permanecer em silêncio. Na verdade, o que o acusado faz é uma opção: em troca dos benefícios que a Lei n. 12.850/13 oferece, ele escolhe abrir mão, voluntariamente, do direito de permanecer em silêncio”, escreveu. “Logo, a escolha do investigado em colaborar com as investigações permanece dentro do âmbito do seu livre arbítrio, pois somente ele poderá avaliar os benefícios advindos da colaboração premiada. É opção exclusiva da sua defesa”, completou. Os ministros Marco Aurélio Mello (aposentado), Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Cristiano Zanin também entenderam pela validade de trechos da lei, mas acrescentaram observações sobre alguns pontos em seus votos. Em seu voto, o ministro Marco Aurélio Mello fez uma análise de como deve ser a atuação do integrante do MP nos casos em que há suspeita de participação de policiais no delito. “O Ministério Público, como destinatário das investigações, deve acompanhar o desenrolar dos inquéritos policiais, requisitando diligências, acessando os boletins de ocorrências e exercendo o controle externo. O que se mostra inconcebível é membro do Ministério Público colocar uma estrela no peito, armar-se e investigar”, declarou. O ministro Gilmar Mendes afirmou que, em relação ao trecho que determina que responde pelo crime de organização criminosa quem obstrui ou dificulta a investigação, é preciso deixar claro que isso não inclui quem usa do direito ao silêncio para não produzir prova contra si. O decano também ressaltou que o direito a não-incriminação é preservado e pode ser exercido a qualquer tempo por quem firma acordo de colaboração premiada. O ministro Nunes Marques seguiu no sentido do voto de Mendes. O ministro Dias Toffoli também acompanhou o relator Moraes, mas acrescentou em seu voto as ponderações sobre o direito ao silêncio de colaboradores estabelecidas pelo ministro Gilmar Mendes. O ministro Cristiano Zanin acompanhou a linha apresentada por Toffoli.