A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) determinou nesta sexta-feira (1º) a abertura de uma consulta pública para revisar a proibição dos cigarros eletrônicos no Brasil. A decisão foi unânime entre os colegiados, e a consulta à sociedade tem validade de 60 dias. Os votos seguiram conforme a decisão do diretor-presidente e relator, Antonio Barra Torres. “Conforme supracitado no Ministério da Saúde, a meta de redução de tabagismo no Brasil em 40% até 2030 está prevista no plano de ações estratégicas para o enfrentamento de doenças crônicas e agravos não transmissíveis no Brasil de, 2009 a 2030, desse Ministério, e que esse referido órgão aponta inteiramente para a alternativa dois do relatório de Análise de Impacto Regulatória, qual seja a manutenção das proibições estabelecidas pela RDC 46 de 2009, com aprimoramento do instrumento normativo e implementação de ações adicionais não normativas. Nesse cenário, destaco as implicações médico-sanitárias e o que temos hoje consolidado como política sanitária de combate ao tabagismo”, justificou Torres, em relação ao seu voto. E continuou: “Permitir o registro neste momento, se apenas para saber o que tem dentro destes produtos, como propagado por alguns atores, sem que se saiba quais são os efeitos à saúde destas substâncias, simplesmente pelo fato de não existirem estudos sobre os danos à saúde causado por elas, principalmente a médio e longo prazo, é expor a população brasileira a riscos inimagináveis e incalculáveis, ato inconcebível pela missão desta Agência Nacional.” Ele reiterou que é importante manter o acompanhamento das evidências científicas e ações regulatórias, lembrando que a Anvisa sempre esteve aberta ao diálogo, assim que se tenham comprovações robustas que mudem o cenário atual. Desde 2009, uma resolução da própria agência proíbe no país a fabricação, a comercialização, a importação e a propaganda de dispositivos eletrônicos para fumar, também conhecidos como vapes. • Clique aqui e receba as notícias do R7 no seu WhatsApp • Compartilhe esta notícia no WhatsApp • Compartilhe esta notícia no Telegram • Assine a newsletter R7 em Ponto Relatório Em 2022, a diretoria colegiada da Anvisa aprovou, por unanimidade, um relatório técnico que indicava a necessidade de manter a proibição dos dispositivos eletrônicos para fumar e a adoção de medidas adicionais para coibir o comércio irregular desse tipo de produto, como o aumento das ações de fiscalização e a realização de campanhas educativas. O documento configura uma espécie de etapa de diagnóstico e estudo, com informações e dados sobre os prováveis efeitos de uma regulação, servindo para verificar impacto, propor cenários para atuação e subsidiar a tomada de decisão. O relatório, portanto, consolida todas as evidências coletadas pela equipe técnica da Anvisa. Entenda os vapes Os dispositivos eletrônicos para fumar são também conhecidos como vape, pod, e-cigarette, e-ciggy, e-pipe, e-cigar e “heat not burn” (tabaco aquecido). Embora sua comercialização seja proibida no Brasil, os dispositivos podem ser encontrados em diversos estabelecimentos comerciais, e o consumo, sobretudo entre os jovens, tem aumentado. Desde 2003, quando foram criados, os equipamentos passaram por diversas mudanças: produtos descartáveis ou de uso único; produtos recarregáveis com refis líquidos; produtos de tabaco aquecido; e sistema de pods, que se assemelham a pen drives, entre outros. “A comercialização, importação e propaganda de todos os tipos de dispositivos eletrônicos para fumar são proibidas no Brasil, por meio da Resolução de Diretoria Colegiada da Anvisa nº 46, de 28 de agosto de 2009. Essa decisão se baseou no princípio da precaução, devido à inexistência de dados científicos que comprovassem as alegações atribuídas a esses produtos.” Perigo à saúde Com aroma e sabor agradáveis, os cigarros eletrônicos chegaram ao mercado com a promessa de serem menos agressivos que o cigarro comum. Entretanto, a AMB (Associação Médica Brasileira) faz um alerta de que a maioria absoluta dos vapes contém nicotina — droga psicoativa responsável pela dependência e que, ao ser inalada, chega ao cérebro entre sete e 19 segundos, liberando substâncias químicas que trazem sensação imediata de prazer. Segundo a entidade, nos cigarros eletrônicos, a nicotina se apresenta sob a forma líquida, com forte poder aditivo, ao lado de solventes (propilenoglicol ou glicerol), água, flavorizantes (cerca de 16 mil tipos), aromatizantes e substâncias destinadas a produzir um vapor mais suave, para facilitar a tragada e a absorção pelo trato respiratório. “Foram identificadas centenas de substâncias nos aerossóis, sendo muitas delas tóxicas e cancerígenas”, destacou a AMB. “O cigarro eletrônico em forma de pendrive e com USB entrega nicotina na forma de ‘sal de nicotina’, algo que se assemelha à estrutura natural da nicotina encontrada nas folhas de tabaco, facilitando sua inalação por períodos maiores, sem ocasionar desconforto ao usuário”, complementou a associação. “Cada pod do cigarro eletrônico no formato de pendrive contém 0,7 ml de líquido com nicotina, possibilitando 200 tragadas, similar, portanto, ao número de tragadas de um fumante de 20 cigarros convencionais. Ou seja, pode-se afirmar que vaporizar um pendrive equivale a fumar 20 cigarros [um maço].” Ainda segundo a entidade, o uso de cigarro eletrônico foi associado como fator independente para asma, aumentando a rigidez arterial em voluntários saudáveis, sendo um risco para infarto agudo do miocárdio, da mesma forma que os cigarros tradicionais. Em estudos de laboratório, o cigarro eletrônico se mostrou carcinógeno para pulmão e bexiga. Surto de doença pulmonar Entre agosto de 2019 e fevereiro de 2020, foi registrado um surto de doença pulmonar em usuários de cigarros eletrônicos. Apenas nos Estados Unidos, foram notificados quase 3.000 casos e confirmadas 68 mortes. Congresso Nacional Além do debate no âmbito da Anvisa, tramita no Senado Federal o projeto de lei (PL) 5.008/2023, de autoria da senadora Soraya Thronicke, que permite a produção, a importação, a exportação e o consumo dos cigarros eletrônicos no Brasil. Jovens Segundo a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2019, 22,6% dos estudantes de 13 a 17 anos no país disseram já ter experimentado cigarro pelo menos uma vez na vida, enquanto 26,9% já experimentaram narguilé e 16,8%, o cigarro eletrônico. O estudo ouviu adolescentes de 13 a 17 anos, que frequentavam do 7º ano do ensino fundamental à 3ª série do ensino médio das redes pública e privada. Controle do tabaco O Brasil é reconhecido internacionalmente por sua política de controle do tabaco. Em julho de 2019, tornou-se o segundo país a implementar integralmente todas as medidas previstas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) no intuito de reduzir o consumo do tabaco e proteger as pessoas das doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs).