Pessoas que dormem depois das 23h têm IMC mais alto, mostra estudo brasileiro

Pessoas que dormem depois das 23h têm IMC mais alto, mostra estudo brasileiro

Um amplo estudo brasileiro constatou que o horário de ir para a cama tem uma relação direta com o peso de cada pessoa: quanto mais tarde cada indivíduo dorme, maior é o IMC (índice de massa corporal), valor calculado com base no peso e na altura, utilizado como referência internacional na definição de sobrepeso e obesidade. • Clique aqui e receba as notícias do R7 no seu WhatsApp • Compartilhe esta notícia pelo WhatsApp • Compartilhe esta notícia pelo Telegram • Assine a newsletter R7 em Ponto A constatação é da pesquisa “Sonar-Brasil: investigações cronobiológicas do sono, alimentação e nutrição”, realizada desde 2021 por pesquisadores da Faculdade de Nutrição da Ufal (Universidade Federal de Alagoas). Os resultados foram publicados na revista científica Sleep Medicine e divulgados em outubro deste ano no Congresso Mundial do Sono, no Rio de Janeiro. Os pesquisadores analisaram as respostas de 2.050 brasileiros adultos, com idade entre 18 e 65 anos, residentes em todas as regiões do país. A primeira etapa ocorreu em 2021, com cerca de 700 pessoas; a segunda foi realizada em 2022; e a terceira teve início em março deste ano, ainda aberta para aqueles que desejam participar. Os voluntários responderam a um questionário online que incluía perguntas sobre dados antropométricos (peso e altura), aspectos do sono (hora de dormir, hora de acordar, se o sono é interrompido durante a noite), hábitos alimentares e prática de atividades físicas, entre outras. Hora de ir para a cama é importante Não existe uma quantidade mínima de horas que uma pessoa deve dormir por noite; cada organismo tem as próprias necessidades. Apesar disso, a recomendação-padrão da Sleep Foundation (Fundação do Sono), organização sem fins lucrativos que realiza diversas pesquisas sobre o assunto, é que um adulto deve dormir entre sete e nove horas por noite para ter um sono reparador. A nutricionista Giovana Longo Silva, professora da Ufal e principal autora do estudo, utilizou essa referência como base para analisar os dados dos voluntários. Ela constatou que quase metade dos entrevistados (45,1%) era de “dormidores tardios”, ou seja, dormiam após as 23h. Além disso, mais da metade deles (51,7%) apresentava uma prevalência de curta duração do sono, com menos de sete horas por noite. A pesquisa também mostrou que 30,1% das pessoas estavam com excesso de peso, e 14,7%, com obesidade. Outra conclusão da pesquisa é que o IMC diminuiu em 0,19 kg/m2 para cada hora a mais de sono. Em contrapartida, esse índice aumentou em 0,19 kg/m2 para cada hora adiada no horário de ir para a cama. Em resumo, os participantes que dormiam mais horas e iam para a cama mais cedo apresentavam um IMC menor do que aqueles que dormiam menos horas e iam para a cama mais tarde. O horário de despertar também foi avaliado, mas não demonstrou uma correlação estatisticamente significativa com o IMC. Apesar de outros estudos já terem ressaltado a relação entre a duração do sono e o IMC, o resultado obtido quanto ao horário de dormir é uma novidade. “Nós constatamos que dormir muito tarde e menos do que o necessário tem uma influência direta no IMC, mas estatisticamente não conseguimos comprovar uma associação entre o despertar e o índice”, disse a pesquisadora. Mas qual é a relação entre o peso e o sono? Há várias hipóteses para explicar como o sono pode afetar a saúde, especialmente no que diz respeito à alimentação. Segundo a nutricionista, a primeira explicação é que um sono ruim causa alterações fisiológicas. “Dormir pouco ou dormir mal aumenta a produção de leptina, que é o hormônio da fome, e reduz a produção da grelina, que é o hormônio da saciedade. Isso tem um impacto direto no dia seguinte, com aumento da fome. Uma única noite maldormida já causa esse efeito no dia seguinte. Tendo mais fome, a tendência é comer mais. Imagine o efeito de dormir tarde ou dormir pouco todos os dias”, alertou a nutricionista. Outra possível explicação é que uma noite maldormida aumenta a fome hedônica, caracterizada pelo desejo por alimentos ricos em açúcar e gorduras, especialmente os ultraprocessados. “Com o corpo fadigado porque não dormimos bem, a nossa tendência é buscar alimentos que nos deem sensação de prazer e conforto. É como o efeito de uma ressaca. A gente busca alimentos que aumentam a energia de forma rápida e, normalmente, são alimentos mais calóricos”, disse. Segundo a neurologista Letícia Soster, do Grupo Médico Assistencial do Sono do Hospital Israelita Albert Einstein, uma das funções do sono é justamente recompor a energia que é gasta ao longo do dia. Ao dormir a quantidade necessária para recompor toda a energia, no dia seguinte a pessoa terá que buscá-la em algum lugar — e esse lugar muito provavelmente será a comida. “Se a pessoa dormir pouco, vai acordar cansada. O corpo precisará repor a energia de forma rápida, e para isso é muito mais fácil consumir alimentos que dão energia mais rápido, como os carboidratos, os açúcares ou os alimentos ultraprocessados”, afirmou. Há ainda a questão da diminuição do gasto energético. Se o indivíduo não dorme o suficiente, ele acorda no dia seguinte cansado, com menos energia. Consequentemente, terá menos disposição e energia para realizar atividades físicas. “Além disso, quanto mais tempo ficamos acordados, mais vamos querer comer. Simples assim. Se vamos dormir muito tarde, provavelmente vamos comer em horários que o nosso metabolismo não será o mesmo de comer durante o dia. Assim, a tendência é engordar”, explicou a pesquisadora do estudo. A especialista do Einstein concorda com a autora e ressalta que o cansaço é maior com a privação do tempo de sono, o que torna mais difícil para a pessoa se dedicar a gastar mais energia. Quando mais cansada, mais ela tende a evitar a prática de exercícios e opta por menos movimentação. “Os impactos de um sono ruim para a saúde são muito grandes. Uma quantidade de sono menor faz uma pior regulação do humor, do controle do metabolismo energético, leva a pessoa a comer mais, aumenta o peso, aumenta o risco de distúrbios do sono, de eventos cardiovasculares. É como se a gente entrasse num círculo vicioso em que um fator acaba piorando o outro”, disse. Para a neurologista do Einstein, o mais interessante desse estudo é que ele demonstra que dormir mais cedo está associado a uma chance de ter um IMC mais baixo. E reforça que a hora de adormecer é importante. “Não adianta dormirmos oito horas durante o dia. Temos que dormir naquele horário, pois somos animais sincronizados com o claro e o escuro. O sono da noite não é o mesmo sono do dia. A gente precisa respeitar o nosso sono e, para isso, é preciso ir para a cama mais cedo”, alertou.  O grupo de pesquisadores da Ufal criou ainda a página Cronus-Sonar no Instagram e no YouTube, onde são divulgadas diariamente dicas de saúde em linguagem acessível para o público. A pesquisadora da universidade espera que os resultados desse trabalho possam ajudar a conscientizar os profissionais da atenção básica de saúde a incluírem nas consultas perguntas sobre os hábitos de sono dos pacientes. Afinal, já está comprovado que a boa qualidade do sono é essencial para a saúde. “O padrão de sono e da alimentação do paciente deve ser avaliado junto a outros fatores de risco. O sono adequado e uma alimentação saudável são essenciais na prevenção de doenças crônicas, entre elas a obesidade e o diabetes”, finalizou.

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