O sucesso de uma eventual divisão em dois do Ministério da Justiça e Segurança Pública, atualmente comandado pelo indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, dependeria da articulação entre forças policiais federais, estaduais e municipais, dizem especialistas ouvidos pelo R7. A separação resultaria na criação de duas pastas — uma da Justiça e outra da Segurança Pública. A ideia foi defendida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em outubro e chegou a ser avaliada durante a transição de governo, no fim de 2022. O debate sobre o arranjo voltou à tona com a indicação, nesta segunda-feira (27), de Dino para assumir a vaga no STF aberta pela aposentadoria de Rosa Weber, no fim de setembro. A delegada da Polícia Civil de São Paulo Raquel Gallinati, diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol), avalia que a criação de uma pasta específica para tratar da segurança pública pode ser um “grande avanço”. Isso se estiver alinhada ao Sistema Único de Segurança Pública (Susp) e a políticas públicas permanentes, além de integrada às diversas atribuições das polícias e das guardas municipais. • Clique aqui e receba as notícias do R7 no seu WhatsApp • Compartilhe esta notícia pelo WhatsApp • Compartilhe esta notícia pelo Telegram • Assine a newsletter R7 em Ponto “Essa integração, juntamente com a observância da Lei Orgânica das Polícias Civis e Militares, pode promover uma abordagem mais coordenada e eficaz no combate à criminalidade e na garantia da segurança da população”, destaca. Ela defende a ideia de que um ministério exclusivo para a segurança pública traria “especificidade, especialidade, atuação concreta e focada em solução de crises, estratégia, planejamento, eficiência na atribuição, legitimidade, investimentos, foco por parte do governo e estrutura”. No entanto, para ela, a eficácia depende “da implementação adequada e do compromisso das autoridades envolvidas em fazer com que as agências de segurança atuem de maneira conjunta”. “A integração das forças de segurança, como a Polícia Civil e a Polícia Militar, pode ser benéfica para compartilhar informações e recursos, melhorando a resposta a situações de segurança”, continua, ao destacar a importância de a divisão seguir “implementação cuidadosa e abordagem multifacetada”. “O sucesso real dependerá de coordenação eficaz entre as agências, investimentos em treinamento e tecnologia, o apoio da sociedade, políticas de prevenção do crime e muito mais. Além disso, o combate ao crime organizado envolve esforços em níveis estaduais, nacionais e internacionais, o que torna a coordenação e a cooperação entre agências ainda mais cruciais”, completa a delegada. A divisão é defendida pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, como destaca o perito aposentado da Polícia Civil do Distrito Federal Cássio Thyone, um dos integrantes do grupo. “Ao nosso ver, seria a melhor condução possível em relação à segurança pública. [A efetividade] depende, é claro, da construção que será feita em cima da divisão, caso ocorra, e da avaliação dos resultados que vão se estabelecer após essa divisão”, diz. Entre as vantagens, o especialista destaca “ter uma equipe dedicada exclusivamente à questão de segurança pública, com recursos, planejamento e metas para a execução de uma política pública, exercendo a postura de coordenação, já que a segurança pública ocorre no âmbito dos estados e dos municípios”. Para o advogado e cientista político Nauê Bernardo, ter uma pasta específica para a segurança pública fortaleceria o combate ao crime, principalmente o crime organizado. “É uma medida muito bem-vinda. É claro que é preciso analisar se haverá aparelhamento para esse ministério e, principalmente, resolver questões como o comando da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal etc.”, comenta. Segundo o jurista, essas eventuais mudanças entram nas atribuições do atual ministério. “Naturalmente, a pessoa que assumir esse posto [de ministro da Justiça] não vai querer perder o comando das polícias, então será preciso dimensionar muito bem essa distribuição de competências”, pondera. Embora preocupem o governo federal, as crises enfrentadas pelos estados não deveriam ser a principal motivação para a criação do Ministério da Segurança Pública, como defende Cássio Thyone. “Não temos a convicção de que esse seja o melhor momento para a divisão. Na nossa opinião, criar um ministério como resposta política para a crise do Rio de Janeiro e da Bahia, por exemplo, não deveria ser a motivação principal”, destaca o especialista, que também analisa o viés político da ação. “Parece que a provável criação está condicionada à saída do atual ministro da Justiça e Segurança Pública para ocupar um cargo no Supremo. Já temos ações em execução [na atual configuração da pasta] que certamente podem sofrer algum tipo de retardamento. Até que se consiga ocupar esses cargos de forma técnica, pode haver um atraso ainda maior na execução dos planos já iniciados”, avalia Thyone. Para Bernardo, o custo político da divisão da pasta é “mais interno do que externo”. “É um custo para dentro do governo, para dentro da base, principalmente para quem assumir o Ministério da Justiça. Se você separa a pasta, você tira um pouco do protagonismo [do eventual ministro da Justiça], porque segurança pública é um dos grandes assuntos do Brasil — sempre foi. Em tese, haverá perda dessa pauta [para quem assumir a Justiça]”, pondera. O também cientista político André César analisa que a divisão pode ser benéfica para a relação entre o Executivo e o Legislativo. “Há outros interesses. Para um governo com muita dificuldade [para aprovação de pautas no Congresso], essa divisão pode ser interessante. É algo a ser discutido. Para a opinião pública, seria uma resposta a mais na questão da segurança. Envolve muitos cálculos políticos e abre espaço para aliados”, avalia. A criação de dois ministérios não seria novidade — em 2018, o então presidente Michel Temer (MDB) dividiu a pasta federal. À época, a área de segurança pública ficou responsável pelos departamentos de Polícia Federal, de Polícia Rodoviária Federal, do Sistema Penitenciário Nacional, além do Conselho Nacional de Segurança Pública, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e da Força Nacional de Segurança Pública.