Nesta época do ano, além de compras frenéticas, boletos variados e compromissos sociais, tem muita gente com a atenção voltada para o retorno ao trabalho. Muitos já largam ansiosos para compensar o que procrastinaram em 2023 como se o ano tivesse um só trimestre de duração. O planejamento estratégico organizado e estruturado com metas distintas de curto e longo prazo deve ser feito com calma. As queixas de estresse, mesmo depois das férias curtidas, elevam-se, as pessoas se sentem exauridas e até ansiosas pelos inúmeros estímulos. Impressionante como alguns de meus pacientes me relatam uma espécie de medo ou insegurança sobre o que fazer durante as primeiras semanas do ano novo e ficam receosos, entram em pânico ao imaginar que possam até perder o emprego após o merecido descanso. Algumas pessoas, mesmo em lugares paradisíacos, não conseguiram relaxar, sentiram-se pilhadas e ficaram hiper vigilantes o tempo todo – através de e-mails, celulares e redes sociais. Digo aos meus pacientes que a busca do equilíbrio deve ser realizada ao longo de todo o ano e não apenas visando as primeiras semanas do retorno. O comportamento, nesse período específico, pode refletir como a pessoa se relaciona e interage com o mundo ao seu redor. Observo que dificilmente as pessoas conhecem seus limites, algumas até se sentem culpadas em períodos de férias ou descanso, sempre com a sensação de que estão deixando de cumprir uma obrigação do trabalho- até levando tarefas para os momentos de lazer a fim de aliviar a culpa pelo “abandono” de suas obrigações trabalhistas. O perfil de personalidade, portanto, pode influir. Há pessoas com personalidade agressiva e competitiva, que não sabem trabalhar com frustrações, limitações, independentemente do ambiente. São pessoas que aprenderam a se relacionar com base na cobrança, na disputa, e estas vão ter maior dificuldade para o relaxamento. Não minimizo jamais o fato de que vivemos em uma rotina de trabalho realmente massacrante, com excesso de metas, cumprimento de jornadas de trabalho desumanas e até deslealdade ou assédio moral corporativos. Grande parte dos profissionais que entram em estado de exaustão ou burnout queixam-se dos aborrecimentos do meio corporativo causados pela artificialidade dos relacionamentos como principal causa de desgaste emocional. E durante o ano inteiro vão se submetendo a rotinas extenuantes e agressivas por medo de perder o trabalho. Algumas empresas também estimulam uma competitividade predatória como forma de estimular a produtividade, o que é um conceito arcaico e em desuso. Chefes autoritários e centralizadoras também levam a um estresse severo de toda a equipe e isso vai contra a criatividade, felicidade e produtividade dos seus subordinados. É importante que não ocorram pré-julgamentos sem conhecimento de causa. Sempre é preciso saber o motivo da amargura. A pessoa pode estar passando por um momento sério de depressão ou ansiedade, causadas por uma perda real ou simbólica, ou sofrer de uma forma crônica de depressão leve, a distimia. No passado, eram chamados de rabugentos ou mal-humorados. Oriento as pessoas a não perderem o foco e o controle sobre suas próprias vidas. Canso de ver pessoas que viveram o trabalho intensamente, 24 horas por dia, por muitos anos, que adoeceram física e mentalmente e depois acabaram sendo descartadas como objetos pelas suas empresas quando já não tinham a mesma capacidade produtiva. É fundamental que mesmo durante o trabalho os profissionais permitam-se momentos de descontração ou lazer, de quebras de rotina e acima de tudo que saibam colocar os limites para si mesmos e para os seus chefes de forma respeitosa. Muitos jovens já buscam empresas com o perfil de valorizar projetos globais de desenvolvimento de seus executivos, mesmo que paguem salários mais baixos. Já se foi o tempo de haver prioridade apenas aos altos salários e bônus – além da mentalidade arcaica de que a empresa privilegia apenas os que se sacrificam integralmente em prol do cargo que ocupam. É fundamental que cada ser humano busque o seu próprio ponto de equilíbrio. E AS PROMESSAS DE ANO NOVO? Entra ano, sai ano, e é a mesma coisa. A mudança de calendário motiva projetos e promessas que, na maioria das vezes, não saem do campo das intenções. A pessoa pode até se sentir frustrada ao relançar a mesma meta para o próximo ano, mas se o desejo não for acompanhado de atitude e reflexão, o mais provável é que nada mude. Toda pessoa com condições materiais minimamente satisfatórias tem condição de ser feliz. Para traçar e viabilizar metas de vida o primeiro passo é se conhecer bem e viabilizar projetos segundo seus potenciais. Não adianta projetar metas inatingíveis para o próximo ano. Procure saber o que satisfaz você em primeiro lugar e o que está dentro da sua realidade, fugindo dos modelos impostos por uma sociedade consumista, individualista, que raramente considera as peculiaridades de cada um. Todos precisamos aprender a aceitar que as mudanças vêm com ganhos e com perdas também. Muitos ficam andando em círculos, fazendo mil projetos que efetivamente não conseguem concretizar e não criam condições para que o projeto se torne exequível. Oriento meus pacientes a começarem com metas menores, não entrando no jogo da sociedade, que é muito comparativa. Vivemos em uma era de vulnerabilidade do indivíduo, que se sente impotente, sem referencial, comparando-se à performance de outras pessoas. É uma imposição de fora para dentro, não são anseios oriundos do seu mundo interno. Isto é o que leva muita gente a sofrer de depressão, síndrome do pânico e outras doenças. Eu sempre acredito no potencial de transformação do indivíduo, seja em qual ciclo da vida estiver, mas admito que quanto mais precocemente a mudança for trabalhada, melhor. Alguns padrões de comportamento mais patológicos podem ficar cristalizados. A pessoa mais velha já estabeleceu uma relação com ela e o mundo ao redor, está acomodada e até com medo do que possa vir acontecer caso mude. Realmente é preciso muita coragem, determinação e capacidade para elaborar as quedas que acabam ocasionando o processo de mudanças. Mas podemos sempre reconstruir nossa história de vida, ressignificando nossas experiências. Fonte: http://www.psiquiatriadamulher.com.br Instagram @profdrjoelrennojr Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.