A recuperação econômica dos Estados Unidos depois da pandemia tem sido mais vigorosa e duradoura do que muitos especialistas esperavam, e a retomada da imigração tem grande impacto nesse fenômeno.
A retomada da emissão de vistos em 2021 e 2022 impulsionou as contratações, permitindo que trabalhadores nascidos no exterior preenchessem algumas lacunas na força de trabalho que persistiram em todos os setores e locais depois das paralisações causadas pela pandemia. Os imigrantes também atendem a uma necessidade de longo prazo: a reposição da força de trabalho, essencial para atender às demandas de mão de obra que acompanham o declínio da taxa de natalidade e o aumento do número de aposentados.
A taxa líquida de migração no ano que terminou em 1º de julho de 2023 foi a maior desde 2017. Os estrangeiros agora representam 18,6% da força de trabalho, e o Escritório de Orçamento do Congresso, entidade governamental apartidária, projeta que, nos próximos dez anos, a imigração vai impedir uma redução drástica no contingente de trabalhadores americanos. Equilibrar as oportunidades e as pessoas que buscam emprego também é fundamental para moderar a inflação salarial e manter os preços sob controle.
A instabilidade internacional, as crises econômicas, as guerras e os desastres naturais provocaram uma nova onda de imigrantes que poderá ajudar a reduzir a defasagem ainda elevada entre a demanda de mão de obra e a disponibilidade de trabalhadores. No entanto, esse possível dividendo econômico precisa enfrentar as políticas incendiárias, os obstáculos logísticos e os atrasos administrativos decorrentes desse movimento.
As visitas ao Texas que o presidente Joe Biden e seu provável oponente eleitoral, o ex-presidente Donald Trump, fizeram na última quinta-feira destacam as tensões políticas. O primeiro está tentando lidar com uma situação fronteiriça que recentemente chamou de “caos”, e o segundo prometeu fechar as portas depois que multidões sem precedentes cruzaram a fronteira durante o governo Biden.
Desde o início do ano fiscal de 2022, cerca de 116 mil pessoas chegaram aos EUA como refugiadas, status que inclui uma rede de reassentamento financiada pelo governo federal e qualificação imediata para o mercado de trabalho. Algumas centenas de milhares de imigrantes que chegaram da Ucrânia e do Afeganistão têm direito a benefícios semelhantes.
Mas um número muito maior de pessoas – cerca de 5,5 milhões – ficou detido nas fronteiras e nos aeroportos e portos marítimos. Nem todas têm permissão para ficar, mas a grande maioria das que ficam recebe pouca assistência do governo. As que solicitam asilo têm enfrentado longos atrasos antes de poder trabalhar legalmente, e uma campanha dos governadores do sul do país as concentrou em algumas cidades que estão lutando para absorvê-las.
A necessidade de mão de obra geralmente é maior em outros lugares. Steve Snyder, agente de negócios da 157ª Divisão do Sindicato de Encanadores e Instaladores Hidráulicos, em Lafayette, Indiana, e presidente da Câmara Municipal, disse que seu sindicato está desesperado por novos membros, especialmente por causa das novas obras de infraestrutura na região: “Eu os receberia de braços abertos, os hospedaria em um hotel e faria o possível para integrá-los na nossa comunidade, porque precisamos deles. Vai ser caro, vai ser desconfortável, mas é algo que, na minha opinião, precisa acontecer.”
Os imigrantes já trouxeram nova energia a pequenas e grandes cidades em declínio. Anuj Gupta dirige o Welcoming Center (Centro de boas-vindas), organização sem fins lucrativos da Filadélfia fundada há 20 anos em um esforço para atrair imigrantes e assim reverter o declínio populacional. “Essa deveria ser uma pauta para ambos os partidos em 2024, porque a economia exige, os empregadores desejam e as pessoas que chegam estão em busca de trabalho”, afirmou Gupta.
O governo Biden adotou medidas para incorporar os imigrantes à força de trabalho, estendendo o status de proteção temporária aos venezuelanos que estavam nos Estados Unidos antes de 31 de julho de 2023, medida que abrange 472 mil pessoas. Também ampliou a concessão de visto humanitário para indivíduos provenientes de países em crise, incluindo Cuba, o Haiti e a Nicarágua; essa concessão geralmente dura dois anos e exige que o candidato tenha alguém para cobrir suas despesas nos Estados Unidos.
Quem está nessas categorias tem direito imediato a permissões de trabalho, mas ainda precisa passar pelos procedimentos necessários para dar entrada no país. O processo de asilo oferece a perspectiva de trabalho legal, mas exige uma espera de pelo menos seis meses depois da solicitação de asilo. Em 2022, esse processo levava em média nove meses.
Os governos estaduais e locais de Nova York e Illinois aceleraram o ritmo no fim do ano passado para dar conta da papelada. As agências começaram a organizar eventos coletivos para processar a documentação, a fim de encaminhar os recém-chegados e contratar os que já tinham seu visto de trabalho. Atualmente, leva menos de um mês para que os solicitantes de asilo e as pessoas com visto humanitário obtenham permissão para trabalhar.
Consequentemente, o número de permissões de trabalho concedidas aos que buscam ou recebem asilo, aos refugiados e às pessoas cobertas por status de proteção temporária e visto humanitário pulou de cerca de 423 mil em 2022 para mais de 1,2 milhão em 2023, de acordo com dados dos Serviços de Cidadania e Imigração dos EUA.
Mas o processamento da documentação ainda é um gargalo significativo. O número de adultos que passam pela fronteira continua a superar o número de solicitações de permissão de trabalho recebidas pelo governo. Para quem não fala inglês, é difícil preenchê-las sem assistência jurídica, que é escassa, e muitas vezes exigem o pagamento de taxas e endereço fixo.
O Grupo de Caridade Católica da Arquidiocese de Nova York já ajudou milhares de pessoas com esse processo burocrático. A instituição também capacita imigrantes para funções específicas, como a de babá, e oferece o treinamento de segurança necessário para trabalhar na construção civil.
Um de seus beneficiários é Edgar Alayón, de 32 anos, que era contador na Venezuela antes de ser expulso de empregos por não apoiar o governo venezuelano. Ele chegou aos Estados Unidos em maio, e o Texas estava fornecendo voos gratuitos para Nova York, onde, segundo ouvira, a prefeitura ofereceria abrigo. Obteve o visto humanitário, mas não começou a trabalhar até receber sua permissão de trabalho em dezembro. Isso permitiu que ele conseguisse empregos na construção civil e sublocasse um quartinho em um apartamento. No entanto, ele só trabalha alguns dias por semana, e seu visto de trabalho expira em maio de 2025.
A cidade de Nova York não é o melhor lugar para procurar trabalho. A taxa de desemprego é de 5,4 por cento, significativamente superior à média nacional. Muitos cargos normalmente ocupados por imigrantes, como em hotéis e restaurantes, nunca se recuperaram totalmente da pandemia. Isso forçou as pessoas a buscar o emprego de entregador, por exemplo, que não demanda qualificação, mas tem muita concorrência.
E a pressão para a emissão de visto de trabalho para os recém-chegados gerou certo ressentimento entre os milhões de outros imigrantes ilegais que ainda não têm acesso ao documento. “É preciso tomar cuidado para não colocar uns contra os outros. Acho que, com o tempo, isso será positivo e eles serão integrados, mas, no curto prazo, é muito perturbador, e as pessoas não podem ficar indiferentes”, declarou James Parrott, diretor de políticas econômicas e fiscais do Centro para Assuntos da Cidade de Nova York da Universidade New School.
Parrott disse que seria útil se os governos estaduais facilitassem a transferência para cidades menores, onde há mais disponibilidade de moradia do que nas grandes cidades onde os ônibus do Texas desembarcaram. Alguns imigrantes conseguiram se dirigir a outros lugares, muitas vezes com a ajuda de uma passagem de ônibus gratuita, mas nem sempre há clareza em relação a quais recursos e oportunidades os aguardam.
Mesmo para aqueles que conseguiram um emprego estável, as permissões de trabalho são uma solução temporária, enquanto os tribunais de asilo permanecem abarrotados de pedidos que agora levam anos para ser julgados, sujeitando os solicitantes a uma incerteza perpétua.
c. 2024 The New York Times Company
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